Seja por causa das dificuldades financeiras que ainda afetam o dia a dia de muitas usinas, seja por condições menos vantajosas que as oferecidas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na última década, é difícil imaginar que os desembolsos de crédito da instituição ao segmento sucroalcooleiro voltarão, no curto prazo, aos elevados níveis de 2007 a 2014. Mas, após fortes quedas em 2015 e no primeiro semestre de 2016, as aprovações de recursos do banco às empresas do ramo voltaram a ganhar força, o que sugere que haverá recuperação nos próximos anos.
As aprovações de financiamentos para usinas, não os desembolsos efetivos, que chegam a demorar dois ou três anos para se concretizar e, assim, demoram um pouco para refletir euforias e crises, já dão sinais de que vão superar, nos próximos meses, os patamares observados nos primeiros meses do ano. Nada capaz de evitar uma nova queda no acumulado de 2016 em relação a 2015, já que, mesmo diante de melhores condições de mercado, as usinas iniciaram a safra atual ainda mais preocupadas em reduzir suas alavancagens do que ampliar as despesas de capital (Capex). Mas o suficiente para marcar esse início de virada no segmento, que tem encontrado no mercado de açúcar bons motivos para uma certa lufada de otimismo.
Segundo Artur Yabe, gerente do Departamento de Biocombustíveis do BNDES, a expectativa do banco é aprovar pouco menos de R$ 900 milhões em crédito para companhias sucroalcooleiras neste último trimestre, quase 50% mais que nos nove primeiros meses do ano. Até 15 de setembro, as aprovações somaram R$ 640 milhões. Em 2016 como um todo, portanto, a instituição prevê aprovar R$ 1,5 bilhão ao segmento, montante que, se confirmado, será 26,5% inferior ao de 2015 (R$ 2,04 bilhões). Apesar da queda ser bastante expressiva, é a perspectiva de aceleração nos próximos três meses que faz Yabe crer que, para as usinas, o fundo do poço ficou para trás.
Mais de 60% dos recursos que devem ser aprovados em 2016 serão para projetos industriais, troca de equipamentos ou ampliação de capacidades, que rarearam nos últimos anos. Mas o total estimado também inclui linhas automáticas de crédito que financiam projetos de até R$ 20 milhões e são liberadas por outras instituições financeiras.
"Também estamos recebendo consultas informais, e é nítido que a situação do segmento já foi pior. Claro que há cautela, já que muitas usinas ainda estão em dificuldades, mas já vemos uma boa parte delas em condições de investir, e pouco a pouco elas têm efetivado sua intenção". Yabe esclarece que a concentração de aprovações esperada para o último trimestre não é sazonal. No ano passado, por exemplo, apenas um quarto do valor total foi aprovado no último quadrimestre.
Na avaliação do gerente do BNDES, os projetos que estão sendo submetidos à aprovação de financiamento do banco também refletem, além da alta do açúcar, medidas adotadas em 2015, como a retomada da cobrança da Cide sobre a gasolina, o aumento da mistura de etanol anidro ao combustível fóssil, e mudanças de tributação estadual como a observada em Minas Gerais, que reduzido o percentual de ICMS cobrado sobre o etanol hidratado.
Juliano Merlotto, sócio da consultoria FG/A, que tem assessorado algumas usinas no processo de captação de recursos do BNDES, observa, contudo, que muitos projetos que estão sendo apresentados neste momento ainda são resultado de uma situação de crise. "São reflexo de um cenário ruim em que as empresas estão buscando eficiência e precisam gerar mais valor com os ativos que possuem". Uma das saídas, segundo Merlotto, é a ampliação da capacidade de cogeração de energia elétrica, que não demanda recursos proibitivos e oferece retorno mesmo com os atuais menores preços da energia.
Essa foi a estratégia seguida pela Usina Cerradão, localizada em Frutal, no Triângulo Mineiro. José Pedro de Andrade, sócio da usina, está na fila esperando que o BNDES aprove ainda neste ano um empréstimo de R$ 50 milhões para concluir, em 2017, a instalação na unidade de uma segunda caldeira a vapor para a produção de energia a partir da biomassa. Até o momento, a usina já sacou de seu caixa mais de R$ 10 milhões para realizar a instalação.
Andrade diz que parte dos recursos pleiteados no BNDES também será utilizada para aumentar em 40% a capacidade de moagem de cana, para 4 milhões de toneladas por safra, e expandir a área agrícola. A aposta em energia acabou acontecendo em boa hora, já que o preço do megawatt-hora (MWh) negociado no mercado livre começou a reagir nos últimos meses. A decisão de investir ocorreu no início do ano, quando os valores ainda estavam mais baixos, mas mesmo assim foi uma forma de expandir o escopo de atuação da Cerradão.
A expectativa de que as usinas voltem a contratar mais recursos junto ao BNDES também acontece em um momento de ajuste fiscal e em que o banco estatal passou a ser comandado por um governo que defende uma menor participação do Estado no fomento à iniciativa privada, característica que se torna mais visível a partir de condições menos vantajosas para a aprovação de financiamentos.
Na maior parte das linhas de crédito ao segmento sucroalcooleiro, o banco passou a financiar, no governo de Michel Temer, 70% do investimento total, enquanto na gestão anterior o percentual era de 90%. Além disso, a taxa de financiamento passou a ser mista, e não mais baseada apenas na Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que está em 7,5% ao ano. Merlotto, da FG/A, observa que essas mudanças acabam por reforçar uma característica que já era marcante nos governos Lula e Dilma: a maior parte dos empréstimos é direcionada a empresas com melhor perfil de crédito, que já conseguem acessar recursos privados.
É o caso da Jalles Machado, que ainda no fim de 2015 teve a aprovação de um empréstimo de R$ 84,89 milhões. Já foram liberados cerca de R$ 50 milhões que estão sendo utilizados para ampliar a capacidade de moagem de cana da usina Otávio Lage, para 1,8 milhão de toneladas, e de armazenamento de etanol, além de aportes na área agrícola.
A Jalles é uma das usinas que estão deixando a crise do segmento para trás, chegou a emitir Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) no ano passado. Com a melhora de sua liquidez, a agência Standard and Poor's (S&P) elevou, em agosto, sua perspectiva para o rating da companhia de estável para positiva, mantendo a nota em "BB-". Em maio, a Fitch Ratings havia elevado a perspectiva de nota de negativa para estável, mantendo a nota na escala nacional em "A-".
Seja por causa das dificuldades financeiras que ainda afetam o dia a dia de muitas usinas, seja por condições menos vantajosas que as oferecidas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na última década, é difícil imaginar que os desembolsos de crédito da instituição ao segmento sucroalcooleiro voltarão, no curto prazo, aos elevados níveis de 2007 a 2014. Mas, após fortes quedas em 2015 e no primeiro semestre de 2016, as aprovações de recursos do banco às empresas do ramo voltaram a ganhar força, o que sugere que haverá recuperação nos próximos anos.
As aprovações de financiamentos para usinas, não os desembolsos efetivos, que chegam a demorar dois ou três anos para se concretizar e, assim, demoram um pouco para refletir euforias e crises, já dão sinais de que vão superar, nos próximos meses, os patamares observados nos primeiros meses do ano. Nada capaz de evitar uma nova queda no acumulado de 2016 em relação a 2015, já que, mesmo diante de melhores condições de mercado, as usinas iniciaram a safra atual ainda mais preocupadas em reduzir suas alavancagens do que ampliar as despesas de capital (Capex). Mas o suficiente para marcar esse início de virada no segmento, que tem encontrado no mercado de açúcar bons motivos para uma certa lufada de otimismo.
Segundo Artur Yabe, gerente do Departamento de Biocombustíveis do BNDES, a expectativa do banco é aprovar pouco menos de R$ 900 milhões em crédito para companhias sucroalcooleiras neste último trimestre, quase 50% mais que nos nove primeiros meses do ano. Até 15 de setembro, as aprovações somaram R$ 640 milhões. Em 2016 como um todo, portanto, a instituição prevê aprovar R$ 1,5 bilhão ao segmento, montante que, se confirmado, será 26,5% inferior ao de 2015 (R$ 2,04 bilhões). Apesar da queda ser bastante expressiva, é a perspectiva de aceleração nos próximos três meses que faz Yabe crer que, para as usinas, o fundo do poço ficou para trás.
Mais de 60% dos recursos que devem ser aprovados em 2016 serão para projetos industriais, troca de equipamentos ou ampliação de capacidades, que rarearam nos últimos anos. Mas o total estimado também inclui linhas automáticas de crédito que financiam projetos de até R$ 20 milhões e são liberadas por outras instituições financeiras.
"Também estamos recebendo consultas informais, e é nítido que a situação do segmento já foi pior. Claro que há cautela, já que muitas usinas ainda estão em dificuldades, mas já vemos uma boa parte delas em condições de investir, e pouco a pouco elas têm efetivado sua intenção". Yabe esclarece que a concentração de aprovações esperada para o último trimestre não é sazonal. No ano passado, por exemplo, apenas um quarto do valor total foi aprovado no último quadrimestre.
Na avaliação do gerente do BNDES, os projetos que estão sendo submetidos à aprovação de financiamento do banco também refletem, além da alta do açúcar, medidas adotadas em 2015, como a retomada da cobrança da Cide sobre a gasolina, o aumento da mistura de etanol anidro ao combustível fóssil, e mudanças de tributação estadual como a observada em Minas Gerais, que reduzido o percentual de ICMS cobrado sobre o etanol hidratado.
Juliano Merlotto, sócio da consultoria FG/A, que tem assessorado algumas usinas no processo de captação de recursos do BNDES, observa, contudo, que muitos projetos que estão sendo apresentados neste momento ainda são resultado de uma situação de crise. "São reflexo de um cenário ruim em que as empresas estão buscando eficiência e precisam gerar mais valor com os ativos que possuem". Uma das saídas, segundo Merlotto, é a ampliação da capacidade de cogeração de energia elétrica, que não demanda recursos proibitivos e oferece retorno mesmo com os atuais menores preços da energia.
Essa foi a estratégia seguida pela Usina Cerradão, localizada em Frutal, no Triângulo Mineiro. José Pedro de Andrade, sócio da usina, está na fila esperando que o BNDES aprove ainda neste ano um empréstimo de R$ 50 milhões para concluir, em 2017, a instalação na unidade de uma segunda caldeira a vapor para a produção de energia a partir da biomassa. Até o momento, a usina já sacou de seu caixa mais de R$ 10 milhões para realizar a instalação.
Andrade diz que parte dos recursos pleiteados no BNDES também será utilizada para aumentar em 40% a capacidade de moagem de cana, para 4 milhões de toneladas por safra, e expandir a área agrícola. A aposta em energia acabou acontecendo em boa hora, já que o preço do megawatt-hora (MWh) negociado no mercado livre começou a reagir nos últimos meses. A decisão de investir ocorreu no início do ano, quando os valores ainda estavam mais baixos, mas mesmo assim foi uma forma de expandir o escopo de atuação da Cerradão.
A expectativa de que as usinas voltem a contratar mais recursos junto ao BNDES também acontece em um momento de ajuste fiscal e em que o banco estatal passou a ser comandado por um governo que defende uma menor participação do Estado no fomento à iniciativa privada, característica que se torna mais visível a partir de condições menos vantajosas para a aprovação de financiamentos.
Na maior parte das linhas de crédito ao segmento sucroalcooleiro, o banco passou a financiar, no governo de Michel Temer, 70% do investimento total, enquanto na gestão anterior o percentual era de 90%. Além disso, a taxa de financiamento passou a ser mista, e não mais baseada apenas na Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que está em 7,5% ao ano. Merlotto, da FG/A, observa que essas mudanças acabam por reforçar uma característica que já era marcante nos governos Lula e Dilma: a maior parte dos empréstimos é direcionada a empresas com melhor perfil de crédito, que já conseguem acessar recursos privados.
É o caso da Jalles Machado, que ainda no fim de 2015 teve a aprovação de um empréstimo de R$ 84,89 milhões. Já foram liberados cerca de R$ 50 milhões que estão sendo utilizados para ampliar a capacidade de moagem de cana da usina Otávio Lage, para 1,8 milhão de toneladas, e de armazenamento de etanol, além de aportes na área agrícola.
A Jalles é uma das usinas que estão deixando a crise do segmento para trás, chegou a emitir Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) no ano passado. Com a melhora de sua liquidez, a agência Standard and Poor's (S&P) elevou, em agosto, sua perspectiva para o rating da companhia de estável para positiva, mantendo a nota em "BB-". Em maio, a Fitch Ratings havia elevado a perspectiva de nota de negativa para estável, mantendo a nota na escala nacional em "A-".