Adaptação às mudanças, suportar as pressões e ter resiliência são expressões facilmente encontradas no cotidiano dos que moldam o perfil comportamental do profissional moderno. Porém, pela repetição, essas características não perderam sua importância, contudo, na palestra ministrada pelo escritor e administrador de empresas no “Encontro de Gerentes 2022” (evento realizado pela Copercana com apoio da Bayer) e nessa entrevista (realizada no dia), fica nítido que o suplemento para conseguir desenvolver tais músculos é a simples percepção. Ela surge de uma mistura de conhecimento, da busca constante de informação, da experiência (da profissão e da corporação) e do entendimento rápido e adequação da postura quando os ventos mudarem de direção, significando o alcance da excelência e, assim, trazer os resultados esperados de uma maneira leve (para você e a empresa), deixando claro que isso é o oposto de pouco trabalho e pressão.
Revista Canavieiros: O principal ponto de mudança da sua carreira é quando estava no auge, como presidente de uma importante empresa, e decidiu alterar o rumo saindo do mundo corporativo se dedicando à formação de opinião. O que levou à tomada dessa decisão?
Max Gehringer: Eu comecei a trabalhar muito cedo, com 12 anos de idade, então quando eu tinha 49 já havia trabalhado demais. Uma vida inteira de dedicação e já havia chegado à presidência de empresas multinacionais. Foi quando percebi que dali para a frente pouco ia agregar e cair numa rotina de sempre fazer mais do mesmo.
Como todo mundo, haviam algumas coisas que eu gostaria de ter feito na vida e não tinha tempo para realizar porque não dava dinheiro e eu tinha que focar no trabalho, sendo uma delas escrever. Dos livros eu recebi um convite para escrever para revistas de negócios como Exame, Você S.A. entre outras várias da editora Abril, e com a visibilidade dessas revistas comecei a fazer palestras e fui para a Rádio CBN e depois para o Fantástico. Assim, acabei criando uma segunda carreira que não foi planejada, mas o resultado dela é muito superior ao que eu pensava. Na verdade eu tive duas carreiras bem distintas, a primeira considero bem-sucedida e a segunda, a atual, muito mais, isso porque eu me tornei uma pessoa conhecida, o que eu nunca esperei ser, e também com uma rotina com controle melhor do meu tempo de dedicação.
Revista Canavieiros: As operações rurais quase sempre vivem um choque entre a gestão mais tradicional, que levou ao crescimento do negócio, e a implementação de novos processos levados pela segunda geração. Qual a conduta que os dois lados precisam ter para que o processo de sucessão seja o mais bem-sucedido possível?
Gehringer: Nós precisamos evitar essa necessidade pela escolha de um lado que passa a nossa sociedade como um todo hoje. De que tudo que está do outro não presta, ou seja, das discussões polarizadas, que quando acontecem em famílias que fazem a gestão de um negócio, é a pior coisa. O lado conservador acha que tudo que é novo é ruim, enquanto que a nova geração vinda da universidade e até mesmo experiências vividas em outros países, ou seja, fez tudo aquilo que os pais e avós não imaginavam fazer por falta de tempo, porque precisavam trabalhar, negando essa experiência. Então, quando um começa a recusar tudo aquilo que o outro fala, será criada uma ruptura com potencial de destruir algo que vem em franco crescimento por gerações. A solução é simples, é uma questão de entendimento, dos mais antigos entenderem que os mais novos devem trazer novas ideias desde que não sejam aquelas que podem quebrar a empresa, que muda radicalmente tudo aquilo que vem sendo feito. Os mais jovens devem entender que existe uma experiência acumulada pelas pessoas que construíram e fizeram a empresa crescer, que tem que ser respeitada, principalmente no sentido de comportamento, confiança e honestidade, valores que não mudam com o tempo. O que era honestidade e sinceridade nos tempos bíblicos continua sendo exatamente a mesma coisa hoje no mundo virtual.
Revista Canavieiros: Qual o segredo para estar aberto e, principalmente, saber selecionar e conduzir as mudanças necessárias na rotina de trabalho.
Gehringer: Eu passei por muitas mudanças com os mais variados cenários, como investimentos em processos ou tecnologias, empresas que estavam numa
situação horrorosa e precisavam mudar ou se juntaram com outras e então tínhamos duas organizações para se tornar uma. Fui comprado uma vez e vendi outra. O que pra mim sempre funcionou é que toda vez que existe uma mudança que vai afetar os profissionais, é preciso ser sincero com eles desde o primeiro momento, pois caso contrário, vira rádio peão e o efeito disso é que cada um vai contar a história como lhe é conveniente e quase sempre nunca é a verdadeira. Então, o que funcionou em mudança não foi ela em si, foi a conquista do envolvimento das pessoas através da postura sincera com elas.
Revista Canavieiros: Sobre a frase: “Nem tão rápido que eu não consiga controlar, nem tão devagar que me dê sono”, qual a velocidade ideal para conduzir (pensando na integração da remuneração com a qualidade de vida) a evolução profissional?
Gehringer: Eu vou dizer uma coisa que disse uma vez e a plateia não gostou muito. Qualquer pessoa pode ter uma carreira bem-sucedida e uma ótima qualidade de vida, mas nunca vai ter as duas coisas ao mesmo tempo. Primeiro precisa trabalhar, acumular dinheiro, e um dia, ter bastante tempo para usufruir do que chamamos de qualidade de vida, que é diferente para cada pessoa, tem gente que acha que é escalar montanhas, outros querem ficar deitados no sofá vendo televisão, mas é uma decisão pessoal. Agora, ao longo do período que passamos a maior parte do tempo trabalhando, mediante o ritmo que o mercado atua com a tecnologia tornando o funcionário dependente da empresa dia e noite, a semana inteira, podendo ser localizado em qualquer lugar, não dá para pensar que vai trabalhar somente dois dias na semana, é uma opção que as pessoas percebem que com o tempo ela não vai funcionar.
Revista Canavieiros: Hoje é comum ver cada vez mais profissionais bons, qualificados, mas infelizes ou então que acabam tornando sua rotina infeliz no trabalho devido a excessos. A felicidade, a paixão naquilo que se faz, corre o risco de morrer no mundo corporativo?
Gehringer: Toda angústia, depressão e eventualmente Burnout (também conhecida como Síndrome do Esgotamento) que acontece com mais frequência atualmente no ambiente de trabalho, se deve ao fato de que, com a revolução tecnológica, é possível fazer a mesma coisa com menos gente, só que os poucos que ficam sofrem muito mais pressão. Não há como dizer para a empresa: “Olha, eu acho que a pressão sobre a minha pessoa é muito pesada e eu não sei se vou suportar”, no mundo de hoje, se você perder suas forças, simplesmente vão colocar outra pessoa no seu lugar.
Revista Canavieiros: Em sua passagem pelo mundo corporativo, você deve ter vivido várias mudanças como a implementação de um sistema como o SAP, que principalmente influencia nas mudanças de processos consolidados dentro da corporação, você acha esse momento positivo? Como o profissional pode tomar proveito dessa fase para crescer?
Gehringer: A decisão de implantar um processo ou sistema é sempre da administração da empresa, quer dizer, se sou um funcionário administrativo e decidiram que vão implementar um sistema, com certeza, hierarquicamente eu não vou poder opinar por ser uma decisão colegiada de diretores e conselheiros, pouco ou quase nada vou influenciar. Eu conheço o sistema SAP há mais de 20 anos, e sei que sua característica específica é não poder mexer nele, ele não é um sistema que permite substituições, trocas, é uma corrente perfeita, cada elo é uma parte do processo, a hora que se tira um, a corrente desmancha. Então, se uma determinada área tem um tipo de sistema que desenvolveu internamente e que funciona muito bem, ele terá que deixar de ser usado porque senão vai travar todo o resto. O SAP não é um jogo de dominó que você vai colocando e tirando as peças conforme a necessidade, ele é um processo contínuo do começo ao fim, nasceu e o seu sucesso no mundo todo é por ser assim, por não permitir que cada um comece a mexer ao seu modo, por isso eu enxergo como uma ferramenta importante.