Produtores passam em cima das tendências e atingem bons resultados em anos complexos da soja
Área de soja sendo colhida pelos irmãos Montenegro: O local do produtor é no campo produzindo
Hoje consolidada, a rotação de cultura já foi um termo que muitos produtores de cana olhavam com cara feia só de ouvir falar, isso porque antes dos avanços tecnológicos das principais lavouras (amendoim e soja), seus ciclos eram muito longos, davam muito trabalho. A variedade de amendoim mais plantada na época, o “tatu”, era virado de forma manual, fora que o risco de quebra também era muito mais alto devido ao baixo desenvolvimento tecnológico disponível, tanto das moléculas de defensivos como dos maquinários para pulverização.
Assim, para muitos canavieiros, o único significado de plantar amendoim ou soja nas áreas de reforma era procurar por problemas, sendo o principal deles o atraso no plantio da cana.
O tempo passou, o processo de evolução da agricultura brasileira se intensificou e muita coisa mudou. Foi o que os irmãos Fabiano, Julio e Rogério Montenegro mostraram para os seus pais, Antonio e Inês, há dois anos para convencê-los a iniciar uma operação de soja nas áreas de reforma de cana da operação tocada em conjunto por toda família.
“Além da nossa terra, na entressafra, nós também ficávamos parados, foi quando nos reunimos e fomos mostrar para o nosso pai que era possível plantar soja sem atrasar o plantio da cana, ele tinha a visão de uma outra época, quando plantou amendoim por mais de 30 anos e há dez deixávamos as áreas em pousio”, disse Rogério.
“Nos comprometemos em dessecar a área, mesmo que isso acarretasse em perder a produção, para não atrasar a programação da cana, então ele liberou 45 alqueires”, contou Júlio, que também falou sobre como formaram o primeiro plantel de maquinário.
“Meu pai tinha os tratores e o pulverizador, os caminhões nós já tínhamos, pois prestamos serviço de transporte para o amendoim e cana, a plantadeira pegamos num consórcio e a colhedora compramos os três irmãos em sociedade, como já tínhamos grande parte da estrutura, o investimento foi viabilizado”.
Outro detalhe, esse fundamental para o sucesso da nova empreitada, foi que além de cuidar de todo o planejamento que demanda uma correria diária, eles assumiram o controle dos tratores e colhedoras, participando diretamente dos manejos, o que rendeu um conhecimento muito rápido sobre o comportamento da cultura, como por exemplo, a velocidade que precisa ser realizado o plantio.
Tanto que hoje os produtores já têm uma segunda plantadeira (uma de seis e outra de sete linhas) e pretendem adquirir outra para o plantio do segundo semestre de 2024, como comentou Júlio: “Um dos nossos primeiro aprendizados é a necessidade de se plantar rápido para aproveitar as janelas de umidade”.
Segundo um cálculo que os irmãos utilizam para justificar a configuração do manejo, o custo só com o reinvestimento em sementes para 15 alqueires já chega ao valor de uma plantadeira usada em boas condições.
Lógico que nada se aprende sozinho, e os novos produtores de grãos contaram com três professores, como destaca Júlio: “Quem ajudou muito no começo foi o André Magro Franco, que é meu cunhado, lembro que no primeiro dia de plantio passamos da meia-noite eu, meus irmãos e ele até deixar as coisas redondas. O Caio Silva Barbosa, agrônomo, também foi muito importante representando a Copercana no sentido de orientação tanto de produtos, como da entrega pós-colheita.
O agrônomo da Copercana, Caio Barbosa, com os irmãos Montenegro, Fabiano, Júlio e Rogério (da esquerda para a direita). Na foto da direita o produtor André Franco que foi, assim como a cooperativa, um dos professores dos Montenegro no início deles na cultura
Nós não tínhamos conhecimento nenhum sobre soja, não sabíamos quais variedades eram melhores, como fazer a adubação, como utilizar os defensivos, fomos aprendendo com os parceiros e a cada dia na roça e hoje eu posso falar que estamos muito felizes com a cultura, mesmo vivendo uma fase de preços bem ruim, é uma realidade totalmente diferente em relação à cana, até o meu pai já está se envolvendo mais”.
O terceiro mestre dos irmãos, esse muito mais rigoroso, vem sendo o clima, completando duas safras em condições totalmente distintas; a primeira muito molhada e a segunda muito seca, eles contam como foi passar nas duas provas.
“O autopropelido havia acabado de chegar, nós não tínhamos muita experiência com a máquina e, como estávamos começando na soja num verão com bastante chuva (2022-2023), não conseguimos trabalhar com as aplicações no momento correto.
Neste ano, o desafio foi outro, tivemos que plantar dentro de uma janela de umidade curta, vendo que era preciso acelerar o manejo, rodamos 24 horas. Para se ter noção da correria, fechamos o negócio da segunda plantadeira numa tarde, quando era meio-dia do dia seguinte havíamos finalizado a montagem dela e ainda instalamos um GPS em um trator. Colocamos o maquinário na prancha e fomos para a área”, contou Fabiano que ainda lamentou uma área onde o plantio acabou não vingando.
“Tivemos um atraso que comprometeu o plantio em apenas três alqueires, o que consideramos pouco, pois se não tivéssemos investido na segunda plantadeira, o prejuízo ultrapassaria os dez alqueires”.
Plantio direto
Com tudo planejado, e até estabelecido em contrato que o último plantio seria feito de maneira direta, os produtores tiveram que rever sua estratégia de última hora, pois osparceiros que arrendaram a área, por estarem com uma infestação alta de Sphenophorus, tiveram que fazer a eliminação da soqueira.
“Foi uma pena, pois nossa experiência da safra passada com o plantio direto, onde fizemos o manejo em 15 alqueires, foi muito positiva, sendo a área que entregou maior produção. Porém tivemos que mudar os planos e perante o que conhecemos não existe um meio termo, ou se faz um preparo de solo muito bem feito ou não se mexe em nada”, disse Rogério, que contou que na área fizeram três grades (uma por conta do parceiro pelo transtorno causado) num intervalo entre a entrega da terra (dia dois de outubro) e o plantio (dia dez), ou seja, em uma semana e um dia.
“Ficamos em cima deles, pois a subsolagem não terminava e, como o André havia nos orientado, depois do preparo é esperar uma boa chuva para assentar o solo, isso porque se a terra estiver muito fofa e chover forte, a semente pode afundar e não germinar, Deus nos ajudou dela vir logo em seguida da terceira gradagem, o que nos permitiu entrarmos plantando em sequência”, comentou Júlio.
Preços em baixa
A fase de preços em decadência da soja, que depois de atingir o teto de R$ 200,00 a saca (Indicador Cepea/USP, posto em Paranaguá), em março de 2022, chegou o mesmo mês de 2024 cotada a R$ 115,00, justamente coincide com a entrada dos irmãos Montenegro no cultivo da cultura, contudo eles não demonstram arrependimento.
“No primeiro ano o valor dos insumos estava muito alto, decidimos segurar em não vender quando a saca estava em R$ 150,00, cobrimos os custos e vendemos agora no começo de 2024 por R$ 120,00. Não perdemos dinheiro, nesta safra acredito que se conseguirmos vender por R$ 110,00 nossa margem será maior.
Para se ter noção da diferença dos custos, em 2022 gastamos mais com adubo para plantar em 45 alqueires que em 2023 onde plantamos em 93 alqueires, isso utilizando produtos com valor agregado muito maior”, disse Rogério.
E eles foram certeiros para conseguir tal resultado, isso porque fecharam a compra dos fertilizantes durante o AgronegóciosCopercana de 2023, quando as principais fórmulas atingiram os menores valores do ano.
“Ser agricultor é a nossa profissão, é o que sabemos fazer, lógico que ninguém gosta de levar prejuízo, mas se você esperar a soja bater 200 reais num ano perfeito de chuva, nunca vai tirar o trator do barracão. Temos que encarar os desafios e tentar aproveitar as janelas de oportunidade, como foi o preço do adubo na feira do ano passado”, conta Julio que também comentou sobre a decisão de antecipar a entrega do adubo, pois havia o risco, que mais tarde foi confirmado, de problemas logísticos no Sudeste devido à compra tardia dos grandes produtores de grãos da Região Centro-Oeste.
... quase que duplicar a área mesmo em anos com a tendência de preços em queda e falta de chuva, criar maneiras para resolver problemas que vão aparecendo (como a carreta reboque para caminhonete levar a plataforma da colheitadeira) e subir no maquinário e conhecer no “pega” do dia a dia como funciona a operação
Variedade
Para entrar na cultura os irmãos seguiram as variedades indicadas por André, assim na empreitada de estréia foram cultivadas as Nidera 6906 e 7709, contudo as lavouras foram formadas em duas regiões, Sertãozinho e Luiz Antônio.
Na temporada seguinte, como a área foi concentrada quase que em sua totalidade em Luiz Antônio, eles optaram pelo uso somente da 7709, como relata Fabiano: “Nesse ano vieram muitos representantes com diversas tecnologias de sementes, algumas até pegamos um pouco para fazer teste, porém focamos na variedade que foi melhor na região que atuamos, sabemos que a soja é melindrosa, qualquer mudança de ambiente ela responde, então não dá para arriscar com material novo em grandes áreas”.
Futuro na mesma toada
Resultados positivos em anos desafiadores e principalmente a família, não somente dos irmãos, mas os pais dando apoio, os animam a continuarem com a soja na entressafra da cana, tanto que para o ano que vem já têm acordados cinquenta alqueires, em apenas um bloco.
“Temos certeza que nossos pais, lógico que se animam em ver o trabalho dar resultado, mas o que os deixam orgulhosos mesmo é ver os três irmãos trabalhando juntos”, finalizou Júlio.
Como era previsto, o resultado final caiu em relação ao ano passado, 84 contra 77 sacas por hectare, o que de forma alguma pode ser encarado como uma derrota, tanto que teve muitas áreas de pivô que não entregaram isso, provando que quando se tem talento, vontade e união, não há clima quem vença o agricultor brasileiro e a relação dos Montenegros com a soja, são a prova disso.
Claro que é muito gratificante para os pais ver os filhos conseguindo vencer suas empreitadas, mas não tem nada como um pai e uma mãe ver os filhos vencerem os desafios da vida unidos